A sepse é uma disfunção orgânica potencialmente fatal causada por uma resposta desregulada do hospedeiro a um quadro infeccioso. O choque séptico é um subconjunto da sepse com disfunção circulatória e metabólica celular associada a maior risco de mortalidade. O tratamento e manejo apropriados nas horas iniciais após o desenvolvimento da sepse melhoram os resultados.
Dessa forma, considera-se a entidade como uma emergência médica, devendo a ressuscitação volêmica guiada por metas ser iniciada imediatamente.
Portanto, vem se tentado imprimir no manejo da sepse a aplicação de “bundles” ou “pacotes”, com o objetivo de aplicar uma estratégia eficiente e segura ao paciente diagnosticado com esta enfermidade.
Em 2012, com a revisão do manejo da sepse, juntamente com as Diretrizes Internacionais para Gerenciamento da Sepse Grave e do Choque Séptico, foram propostos pacotes de atendimento para a sepse, divididos em dois momentos: o pacote das 3 horas e o pacote das 6 horas, conforme descrito abaixo.
PACOTE 3 HORAS: ·
- Medida do nível de lactato. ·
- Obtenção de culturas antes da administração de antibióticos. ·
- Administração de antibióticos de amplo espectro. ·
- Administração de 30 mL / kg de Cristalóide para Hipotensão ou Lactato ≥ 4 mmol / L.
PACOTE 6 HORAS ·
- Considerar vasopressores para hipotensão que não responda à ressuscitação inicial com líquidos para manter uma pressão arterial média (PAM) ≥ 65 mmHg. ·
- Para os casos de hipotensão arterial persistente, apesar da ressuscitação volêmica (choque séptico) ou Lactato inicial ≥4 mmol / L (36 mg / dL), considerar medida da PVC ( pressão venosa central) e ScvO2 (Saturação de Oxigênio Venoso Central).
- Recoletar o lactato, se inicialmente estiver alterado.
O Instituto Latino-Americano de Sepse (ILAS), após revisão das diretrizes internacionais publicadas para a gestão de sepse e choque séptico, sugeriu para o tratamento da sepse os mesmos pacotes, entretanto, algumas considerações foram feitas. Foi enfocado o tempo dentro do pacote inicial para um item específico, por exemplo, a coleta do lactato que estaria no pacote inicial das primeiras 3 horas, deveria ser realizada dentro da primeira hora do atendimento. De maneira didática, listamos abaixo a proposta sugerida pelo ILAS em 2016 para o atendimento inicial do paciente com sepse:
ILAS – PACOTE 3 HORAS ·
Coleta do lactato nos primeiros 30-60 minutos do atendimento. ·
Obtenção de culturas antes da administração dos antibióticos, porém sem postergar a administração do antimicrobiano, caso não seja possível a coleta antes da primeira dose. ·
Administração antibiótico de amplo espectro na primeira hora, podendo ser considerado uso de diferentes classes em caso de choque séptico. ·
Para pacientes hipotensos (PAM < 65 mmHg ou PAS < 90 mmHg ou redução da PAS em 40mmHg da habitual, ou sinais de hipoperfusão, incluindo lactato maior que duas vezes o valor referencial normal, deve ser administrado cristaloide na dose de 30ml/kg nas primeiras 3 horas.
ILAS – PACOTE 6 HORAS ·
- Considerar vasopressores para hipotensão que não responda à ressuscitação inicial com líquidos para manter uma pressão arterial média (PAM) ≥ 65 mmHg. ·
- Recoletar o lactato nos pacientes que apresentaram alteração inicial. ·
- Reavaliação da ressuscitação volêmica através da medida de PVC, variação pressão de pulso, variação de distensão da cava, elevação passiva dos membros inferiores, entre outras formas. ·
- Considerar uso de dobutamina nos pacientes cque permanecem com sinais de baixo débito e hipoperfusão. ·
- Considerar hemotransfusão.
Em abril de 2018, autores da Campanha de Sobrevivência à Sepse (CSS), iniciativa da European Society of Intensive Medicine e da Society Critical Care Medicine, publicaram na Intensive Care Medicine, uma nova atualização dos pacotes de tratamento da sepse. Nessa publicação, os pacotes de 3 e 6 horas foram extintos, criando-se o pacote novo de 1 hora.
PACOTE 1 HORA CSS 2018 : ·
- Medida do lactato, devendo ser realizada nova coleta se o nível inicial estiver alterado, dentro das próximas 2-4 horas; ·
- Coleta de hemoculturas antes do início do antibiótico, não devendo ser retardado o seu início caso seja possível a realização da coleta; ·
- A terapia empírica de amplo espectro com um ou mais antimicrobianos intravenosos para cobrir todos os patógenos prováveis deve ser iniciada imediatamente para pacientes com sepse ou choque séptico; ·
- Administração rápida de cristaloide 30ml/kg se hipotensão ou lactato maior ou igual a 4 mmol/L, devendo ser concluída nas primeiras 3 horas. ·
- Dar vasopressores se paciente estiver com hipotensão durante ou após a ressuscitação volêmica para manter PAM ≥ 65 mmHg.
Aproximadamente, um mês após a publicação desse artigo, o ILAS, em seu programa de melhoria de qualidade, optou por adotar o novo pacote de 1 hora, porém com algumas ressalvas:
ILAS PACOTE 1 HORA 2018 ·
- A terapia empírica de amplo espectro com um ou mais antimicrobianos intravenosos para cobrir todos os patógenos prováveis deve ser iniciada imediatamente para pacientes com sepse ou choque séptico; ·
- Coleta de hemoculturas antes do início do antibiótico, não devendo ser retardado o início do tratamento caso não seja possível a realização da coleta; ·
- Medida do lactato, devendo ser realizada uma segunda coleta como tempo limite de 4 horas por ser fundamental a manutenção do indicador; ·
- Administração de fluidos quando pertinente, adotando o início da hipotensão ou a identificação da hiperlactatemia como tempo zero para início da reposição volêmica (cristaloide 30ml/kg).
- Não é factível definir a necessidade do vasopressor na primeira hora, pois sua indicação dependerá da resposta à reposição volêmica de cada paciente;
- A reavaliação do status volêmico e da perfusão dos pacientes em choque será mantido como limite de 6 horas para ser completado.
Nossa opinião:
Julgamos que a mudança proposta pelo ILAS para o novo pacote de uma hora é o entendimento da urgência na abordagem do paciente com sepse, mesmo nos países com limitação dos recursos.
A proposta realizada pela CSS é pertinente, porém devemos atentar que, do ponto de vista de qualidade, também se faz necessário manter o paciente numa linha contínua de cuidado. Quando o foco se restringe à primeira hora, existe o risco de perda desse seguimento.
O tratamento da sepse deve ter como objetivos primordiais o controle do quadro infeccioso e a proposta de ajuste hemodinâmico. A análise sobre a necessidade do uso ou não de vasopressor precocemente deve ser individualizada, personalizando o tratamento à beira-leito.