A prevalência da estenose aórtica grave tem aumentado por conta do envelhecimento populacional. A troca da valvar aórtica é o único tratamento eficaz para estenose aórtica sintomática grave e, apesar dos dados limitados dos ensaios clínicos randomizados, as diretrizes atuais recomendam a cirurgia de troca valvar aórtica por causa da história natural sombria desse distúrbio. Embora 30 a 50% dos pacientes com estenose aórtica grave são assintomáticos no ato do diagnóstico, o momento apropriado da intervenção para esses pacientes permanece controverso. Com base no consenso de que o benefício potencial da troca da valva aórtica para evitar morte súbita não pode ser maior que o risco de morte durante ou dentro de 30 dias após a cirurgia (frequentemente chamada de mortalidade operatória) e morte relacionada à prótese valvar aórtica, recomenda-se observação para a maioria dos pacientes assintomáticos com estenose aórtica grave e a troca da valva aórtica é recomendada uma vez que o paciente apresente sintomas. Entretanto, avanços nas técnicas cirúrgicas e nas próteses valvares aórticas podem alterar a relação risco-benefício da cirurgia, principalmente entre os pacientes com baixo risco cirúrgico. A comparação da cirurgia convencional precoce versus tratamento conservador na estenose aórtica grave foi projetada no estudo RECOVERY para comparar resultados clínicos de longo prazo entre a troca da valva aórtica e a estratégia conservadora com base nas diretrizes atuais para pacientes assintomáticos com estenose aórtica grave. A principal hipótese deste estudo foi que a incidência de morte por doenças cardiovasculares seria menor entre os pacientes submetidos à cirurgia precoce do que entre os que receberam tratamento conservador.
MÉTODOS
Em um ensaio multicêntricos, foram atribuídos aleatoriamente 145 pacientes assintomáticos com estenose aórtica muito grave (definida como uma área de válvula aórtica de ≤ 0,75cm2 com uma velocidade de jato aórtico de ≥ 4,5 m/s ou um gradiente transaórtico médio ≥ 50mm Hg) para cirurgia convencional precoce ou para tratamento conservador de acordo com as recomendações das diretrizes atuais. O end-point primário foi um composto de morte durante a cirurgia ou dentro de 30 dias após a cirurgia (chamada de mortalidade cirúrgica) ou morte por causas cardiovasculares durante todo o período de acompanhamento. O end-point secundário principal foi morte por todas as causas durante o acompanhamento de 8 anos.
RESULTADOS
No grupo de cirurgia precoce, 69 dos 73 pacientes (95%) foi submetida a cirurgia em 2 meses após a randomização e não houve mortalidade relacionada ao procedimento cirúrgico. O end-point primário ocorreu em 1 paciente no grupo de cirurgia precoce (1%) e em 11 dos 72 pacientes do grupo de tratamento conservador (15%). Morte por todas as causas ocorreu em 5 pacientes do grupo de cirurgia precoce (7%) e em 15 pacientes do grupo de tratamento conservador (21%). No grupo de tratamento conservador, a incidência cumulativa da morte súbita foi de 4% em 4 anos e 14% em 8 anos.
CONCLUSÕES
Entre os pacientes assintomáticos com estenose aórtica muito grave, a incidência composta de mortalidade relacionada ao procedimento cirúrgico ou morte por causas cardiovasculares durante o período de acompanhamento foi significativamente menor entre aqueles que foram submetidos à cirurgia precoce da valva aórtica do que entre aqueles que receberam apenas tratamento conservador.
NOSSA OPINIÃO
Os resultados deste ensaio indicam que a cirurgia precoce resulta em melhor sobrevida em 8 anos em comparação com tratamento conservador. Estes são resultados importantes e, provavelmente, modificará as orientações sobre este tema. Atualmente, a cirurgia para estenose aórtica assintomática tem uma indicação de Classe IIb da diretriz de doença valvar da AHA/ACC. Há dados observacionais de que pacientes com velocidade máxima > 5m/s podem se beneficiar especialmente se forem candidatos de baixo risco cirúrgico. O teste ergométrico foi empregado apenas seletivamente; assim, alguns pacientes poderiam ter estenose aórtica sintomática “oculta”, que seria identificada com um teste de estresse. Outro fato é que pacientes alocados no braço tratamento conservador tinham mais valva aórtica bicúspide comparados com grupo cirurgia precoce (67% vs 54%). Um estudo em andamento, o EARLY-TAVR (troca valvar transcateter), procura registrar uma população assintomática semelhante, mas por esse motivo todos os pacientes são obrigados a realizar teste de esforço. Lembrando que o estudo RECOVERY utilizou a cirurgia convencional, o que não se aplica à troca valvar transcateter. Devemos aguardar se estes estudos modificarão as atuais recomendações das diretrizes.
Referência: baixe o estudo completo AQUI