O prolongamento do intervalo QT induzido por drogas há muito tempo serve como um indicador do aumento do risco de torsades de pointes (TdP), uma taquicardia ventricular polimórfica potencialmente letal. No entanto, a relação entre o prolongamento do intervalo QT e o risco de TdP é imperfeita e complexa. O risco de TdP não é uma função linear da duração do intervalo QT nem da extensão da mudança; alguns medicamentos que prolongam o QTc não estão associados ao aumento da morte arrítmica. Embora apenas uma pequena proporção de pacientes com prolongamento do QTc sofra TdP, o prolongamento do QT associado a medicamentos está associado ao aumento da mortalidade arrítmica e não-arrítmica e, portanto, continua sendo uma métrica importante da segurança dos medicamentos.
A cloroquina e seu derivado mais contemporâneo, a hidroxicloroquina, permanecem em uso clínico por mais de meio século como uma terapia eficaz para o tratamento de casos de malária, lúpus e artrite reumatoide. Os dados mostram inibição dos canais iônicos de potássio (iKr) e consequente prolongamento do intervalo QT associados a ambos os agentes. Apesar dessas descobertas, várias centenas de milhões de tratamento com a cloroquina têm sido utilizados em todo o mundo, tornando-a um dos medicamentos mais amplamente usados na história, sem relatos de morte arrítmica segundo a Organização Mundial da Saúde. No entanto, a ausência de um sistema ativo de vigilância de segurança de medicamentos na maioria dos países (países pobres) limita a segurança dessas observações.
A azitromicina, um antibiótico macrolídeo usado com frequência, carece de fortes evidências farmacodinâmicas da inibição dos iKr. Estudos epidemiológicos estimaram 47 mortes cardiovasculares, presumidamente arrítmicas, por 1 milhão de casos, embora estudos recentes sugerem que isso possa estar superestimado. Há dados limitados avaliando a segurança da terapia combinada, porém estudos in vivo não mostraram efeitos arrítmicos sinérgicos da azitromicina com ou sem a cloroquina.
Sabe-se que vários fatores contribuem para o aumento do risco de TdP induzida por drogas, incluindo sexo feminino, doença cardíaca estrutural, síndrome do QT longo congênito, distúrbios eletrolíticos, insuficiência hepática / renal e medicamentos concomitantes que prolongam o QT. A segurança dos medicamentos que prolongam o intervalo QT pode ser maximizada pelo monitoramento e otimização rigorosos desses fatores. Um escore de risco foi derivado e validado por Tisdale et al., para predição do prolongamento do intervalo QT associado a medicamentos entre pacientes hospitalizados em unidades de cuidados cardíacos (Tabela 1). Um escore de Tisdale ≤ 6 prediz baixo risco, 7-10 risco médio e ≥ 11 alto risco de prolongamento do intervalo QT associado a medicamentos (Tabela 2).
Tabela 1. Escore de risco para prolongamento do QTc associado a medicamentos (escore de Tisdale)
Fatores de risco | Pontos |
Idade ≥ 68 anos | 1 |
Sexo feminino | 1 |
Diuréticos de alça | 1 |
K+ sérico ≤ 3,5 mEq / L | 2 |
QTc na admissão ≥ 450 ms | 2 |
IAM | 2 |
≥ 2 medicamentos que prolongam o QTc | 6 |
Sepse | 3 |
Insuficiência cardíaca | 3 |
1 medicamento que prolonga o QTc | 3 |
Pontuação máxima de risco | 21 |
K+ = potássio;
IAM = infarto agudo do miocárdio. |
Tabela 2. Níveis de risco para prolongamento do intervalo QT associado a medicamentos
Baixo risco ≤ 6 pontos |
Risco moderado entre 7-10 pontos |
Alto risco ≥ 11 pontos |
Monitoramento sugerido para uso clínico hospitalar
Os pacientes admitidos com COVID-19 provavelmente têm QTc basal mais longo e apresentam maiores riscos arrítmicos em potencial como resultado das sequelas metabólicas e fisiológicas de sua doença e uma carga tipicamente maior de doenças associadas. No entanto, dada a gravidade da doença, pacientes hospitalizados e gravemente enfermos também podem obter o máximo benefício de terapias potencialmente eficazes. O objetivo da triagem de QTc nesse cenário não é identificar pacientes que não são candidatos à terapia, mas identificar aqueles que apresentam maior risco de TdP, para que medidas defensivas agressivas possam ser implementadas.
- Linha de base
- Interrompa e evite todos os outros agentes prolongadores não críticos do QT.
- Avalie um ECG basal, função renal, função hepática, potássio sérico e magnésio sérico.
- Quando possível, solicite a um cardiologista / arritmologista experiente para medir QTc.
- Contraindicações relativas (sujeitas a modificação com base nos benefícios potenciais da terapia)
- História de síndrome do QT longo, ou
- QTc basal > 500 ms (ou > 530-550 ms em pacientes com QRS maior que > 120 ms)
- Monitoramento contínuo, ajuste da dose e descontinuação do medicamento
- Monitore e otimize o potássio sérico diariamente.
- Realize ECG 2-3 horas após a segunda dose de hidroxicloroquina e diariamente depois.
- Se o QTc aumentar em > 60 ms ou absoluto > 500 ms (ou > 530-550 ms se QRS > 120 ms), interrompa a azitromicina (se usada) e / ou reduza a dose de hidroxicloroquina e repita o ECG diariamente.
- Se o QTc permanecer aumentado > 60 ms e/ou QTc absoluto> 500 ms (ou > 530-550 ms se QRS > 120 ms), reavaliar o risco-benefício da terapia em curso, considere a consulta com um arritmologista e considere a descontinuação da hidroxicloroquina.
Este texto é um resumo do artigo produzido por Timothy F. Simpson, Richard J. Kovacse Eric C. Stecker.